Nascerás mulher no Brasil

Se tiver sorte, não serás morta pelo seu companheiro ou familiar (Brasil registra 722 feminicídios em 2023). Se tiver sorte, não serás agredida (Número de mulheres vítimas de violência é o maior em cinco anos) no campo (Brasil teve mais de 30 mil denúncias de mulheres vítima de violência doméstica no campo) ou na cidade (Violência contra a mulher: aumento de casos acende alerta no DF). 

Também a depender da sua sorte, não serás estuprada (Brasil tem 822 mil casos de estupro a cada ano. Dois por minuto). 

Além de ser a única responsabilizada pelas consequências de atos sexuais praticado por duas pessoas ( Brasil registrou mais de 100 mil crianças sem o nome do pai só neste ano. São quase 500 por dia), caso não tenha sorte e seja estuprada e deste estupro surja um embrião; caso você deseje imensamente ter um filho, mas não teve a sorte de uma gravidez saudável e corra o risco de morrer; caso você tenha desejado muito um filho, tenha concebido, mas ele, durante a formação uterina não desenvolva um cérebro e vá, inevitavelmente, morrer, o que te submeteria a um luto atroz, você deve sofrer nova violência. 

Você deve, antes encerrar com o fruto tangível da dor de ser submetida e subjugada no que temos de mais íntimo; antes de poder seguir vivendo - literalmente-  a sua vida e construir planos futuros, inclusive de adotar uma criança, quem sabe?; antes de optar se quer ou não passar pela dor de enterrar um filho, você deve ser novamente agredida. 

Você deve ouvir o coração do embrião, do feto que te matará, do feto que não sobreviverá. 

Você deve sentir, mais uma vez, o peso do domínio da sociedade sobre o seu corpo. Sobre a sua vida. Sobre a sua escolha. Você não tem escolha. Você não teve nem sorte. 

Admitam, vocês não são só machistas. Vocês são sádicos.